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The tyranny of evil men

por Pedro Delgado Alves, em 28.02.13

 

Ouvi há pouco na televisão que o Cinema Londres, na Avenida de Roma, em Lisboa, fechou portas. Mais uma sala clássica de cinema da cidade que encerra, por insustentbilidade financeira. Um panorama já pobre vai emagrecendo com os efeitos da crise. E, note-se, a programação do Londres nem era particularmente alternativa ou para públicos menos amplos, oferecia títulos de cinema dito comercial e as estreias do momento. Infelizmente, não consigo deixar de pensar qual será o próximo a cair, quando recordo as sala semi-vazias em sessões de fim-de-semana noutros locais. 

 

As pessoas ouvidas na peça lamentam a redução da oferta, numa zona da cidade em que uma população mais envelhecida e com menor mobilidade vai ficar sem respostas culturais perto de casa, agravando o seu isolamento e reduzindo acesso à cultura. Todos recordam o que por lá foram vendo ao longo dos anos, havendo cinema para todos os gostos - um Super-Homem, um Bergman, um dos nomeados dos óscares deste ano.

 

Não era dos sítios que mais frequentava, mas também me junto ao exercício de nostalgia inesperada. E nesse registo, para além das mais recentes recordações que guardo do DocLisboa (em que quase tudo o que vi foi precisamente ali), o Londres (que espero que consiga reabrir e sobreviver aos tempos da Troika) será para sempre o cinema do Pulp Fiction. 

 

 

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publicado às 23:14

Entretanto, no planeta Tea Party, na galáxia de Rand

por Pedro Delgado Alves, em 28.02.13

O Congresso dos Estados Unidos aprovou finalmente a renovação da Lei sobre Violência contra as Mulheres (Violence Against Women Act - VAWA, aprovada inicialmente em 1994), quinhentos dias depois da maioria republicana na Câmara dos Representanes ter deixado expirar a legislação. Ainda assim, 138 (sim, cento-e-trinta-e-oito!) republicanos conseguiram votar contra a iniciativa, tendo alguns reiterado que não se tratava apenas de uma divergência quanto ao conteúdo de algumas disposições e que votariam contra qualquer versão alternativa do projecto. E que poderosos argumentos se conseguem arregimentar contra legislação desta natureza? Ora aqui vai um exemplo: 

 

"This is a feel-good measure that uses ‘Violence Against Women’ as an excuse to vastly expand a dizzying array of government grant programs, hamstring judges who are attempting to resolve and reconcile highly volatile relationships, add $1.8 billion to the nation’s debt and generally insinuate the federal government into matters the Constitution clearly reserves to the states. Federal grants of all kinds (essentially gifts of public money with little or no oversight) are out of control and ought to be abolished — not expanded.” ["Trata-se de uma medida para consolar consciências, que usa a "Violência contra as mulheres" como uma desculpa para expandir um conjunto extonteante de programas de subsídios governamentais, subordina juízes que estão a tentar resolver e assegurar a reconciliação e relações altamente voláteis, adiciona 1.8 mil milhões de dólares à dívida nacional e insinua uma ingerência do governo federal em matérias que a Constituição reservou aos Estados. Subsídios federais de todos os tipos (essencialmente ofertas de dinheiro público com pouca ou nenhuma fiscalização) estão fora de controlo e deveriam ser abolidos - e não objecto de expansão".] 

 

A violência doméstica como conspiração utilizada para alargar o leviatânico poder do Estado e arranjar maneira de aumentar a dívida. Nem com toda a imaginação do mundo lá chegaria. 

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publicado às 20:44

Horas e locais

por Pedro Delgado Alves, em 28.02.13

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publicado às 20:37

Faria diferença?

por neruska, em 28.02.13

Uma das questões que mais me assusta nesta crise é a descrença relativamente aos políticos e o que isso representa de descrença no sistema democrático.

Bem sei que há todo o tipo de maus exemplos que proliferam nos meios politicos: os vícios, a endogamia, o facto de a motivação da maioria das pessoas disponíveis para exercer cargos políticos não ser o interesse na causa pública, só para nomear alguns.

Contudo, uma pulsão violenta domina-me de cada vez que ouço alguém, normalmente pessoas cuja vida não é minimamente imaculada do ponto de vista do cumprimento dos deveres cívicos, fiscais ou mesmo para com os seus semelhantes, dizer que o povo até é bom, mas os políticos são todos maus. Como se os políticos não viessem dessa massa ou fosse uma questão de azar esta coisa de nos calhar na rifa uns cretinos quando o povo é tão bom.

Apesar de perceber muito bem que as pessoas não se sintam atraídas pela vida pública, não só mas também pelo que isso representa em potência de se ser enxovalhado em praça pública, acredito que cada povo tem políticos à sua imagem.

Cabe ao povo definir o que pretende que os seus políticos sejam. Compete a cada um de nós demonstrar, não apenas em atos eleitorais, o que pretendemos ver defendido pelos nossos políticos. Infelizmente, para a grande massa, sempre foi infinitamente mais fácil obedecer do que lidar com as escolhas e a responsabilidade da liberdade. E, neste momento, uma dormência mental ajuda a que o peso das dinâmicas de sobrevivência de cada um seja entorpecedor de uma cidadania ativa, para a qual nunca fomos realmente educados.

Partilho uma ideia de democracia direta que, não sendo de todo inovadora no mundo, me parece reunir os requisitos no sentido de mudar o estado desta relação desavinda.

Os deputados da República deviam ter gabinetes de atendimento aos cidadãos. Já sabemos que existem mil e uma formas e canais de chegar aos ditos, desde as audiências às petições. Mas claramente não têm funcionado como desbloqueador desta distância que se estabeleceu entre os políticos e o povo. Há sistemas políticos em que constitui uma obrigação para os titulares de alguns cargos políticos a existência de tais locais de atendimento. Para além do que representaria em termos de uma tentativa real de resolver problemas concretos das pessoas, seria uma forma de os deputados sentirem o pulsar dos seus concidadãos.

Faria diferença?

Eu acho que sim.

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publicado às 18:39

Leituras

por David Areias, em 27.02.13

Rui Zink
A Instalação do Medo
Teodolito, 2012


"- A senhora sabe o que dizia o capitão do navio negreiro aos escravos no porão quando estes se queixavam de sede e fome?
- Exactamente, minha senhora.
- 'Nada de queixumes. Estamos todos no mesmo barco.'
- E era a mais pura verdade.
- Só que os escravos, já se sabe, só viam o ponto de vista deles.
- Há gente muito egoísta.
- Por isso, precisamente, para lutar contra o egoísmo, há que instalar o medo.
- E é assim mesmo, minha senhora. O medo, quando bem instalado...
- Tem é que ser bem instalado...
- O medo, bem instalado, substitui as Más Perguntas pelas Boas Respostas.
- Ao infantilizar-nos, minha senhora, o medo não nos diminui, antes nos eleva.
- O medo devolve-nos a infância do mundo."

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publicado às 21:58

Continuarei...

por Pedro Vaz, em 27.02.13

Stéphane Hessel morreu ontem com 95 anos. Deixou-nos um apelo para que não nos resignemos, para que lutemos por uma sociedade mais justa e igual. Eu continuarei a indignar-me contra a injustiça e contra uma sociedade dominada por elites que "domam" as nações a seu bel-prazer. Continuarei a indignar-me e a agir contra as inevitabilidades que nos castram a felicidade e os sonhos e que nos impede de nos realizarmos enquanto pessoas e cidadãos.

 

Foto: Miguel Manso (Público)

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publicado às 13:37

Lições italianas - II

por Pedro Delgado Alves, em 27.02.13

Para além do caos final que resulta de um parlamento dividido e sem matemática coligatória, todo o rasto da campanha é francamente desolador, com destaque para o discurso e para o modelo eleitoral que ajudou a agravar o desfecho.

 

Quanto ao discurso, não poucas vezes resvalou para a agitação de fantasmas anti-europeus (começando por Beppe Grillo, que defende a saída da Itália do Euro) e anti-germânicos (trazendo-nos à memória o Berlusconi acossado em Estrasburgo a chamar guarda de campo de concentração a Martin Schulz). Mais do que abrir caminho para inovação, entricheirou as lideranças em buracos dos quais dificilmente podem sair para construir um governo minimamente aceitável.

 

Quanto ao processo eleitoral, tornando o cozinhado ainda mais explosivo, a experimentação eleitoral que procura inventar sistemas que produzam estabilidade acabou por oferecer um bónus à ingovernabilidade. Eis o resultado de procurar mexer no sistema eleitoral para resolver problemas que não foram causados pelo sistema eleitoral, nem se resolvem com artifícios esquemáticose de mais do que duvidosa democraticidade. As doenças dos sistemas políticos em quebra de credibilidade não são as formas de eleger os titulares de cargos políticos, mas sim a falta de soluções, de credibilidade ou renovação desses mesmos titulares.  

 

Num contexto de quase caos político, de cavalgada de populismos antigos e novos, de crise financeira em potencial regresso, a Itália pode, pelo menos, apresentar uma vantagem em relação aos nossos póprios problemas (alguns mais graves, outros menos, sublinhe-se). Tem pelo menos um Presidente da República digno desse nome, inteligente e com capacidade de distinguir o acessório do essencial, e que provavelmente representa uma das poucas garantias de uma saída menos má nos seus últimos meses como Chefe de Estado, apesar dos muitos constrangimentos que o seu fim de mandato lhe colocam. Um Presidente num sistema parlamentar que bem podia inspirar lusos semipresidencialismos.

 

Só nos resta mesmo desejar Buona fortunasignore Napolitano!

 

 

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publicado às 00:41

Lições italianas - I

por Pedro Delgado Alves, em 27.02.13
Os Italianos foram às urnas e a Europa regressou aos solavancos à montanha-russa financeira. Entre ilustrar o post com os homens do momento ou um gráfico com as desventuras da moeda única, hesitei entre qual traduziria melhor o espírito dos dias que correm. Duma Itália que entrou em meltdown político cujo desfecho ninguém se atreve a prever, retiremos pelo menos, se não lições, pelo menos algumas reflexões que podem ser úteis cá no burgo.  
O grande derrotado da noite, Bersani não consegue ser o messias do Partido Democrático. A reflexão sobre o futuro político deve ser aqui a mais urgente e dura. Combinando duas décadas de evolução, realinhamento, reorganização e reinvenção da esquerda italiana, empurrando-a para o centro, tornando-a menos ideológica para a tornar mais elegível, o resultado foi uma vantagem de 0,4 por cento sobre Berlusconi numas eleições em que o eleitorado estava sedento de quem lhe rejeitasse a austeridade e se constituisse como alternativa séria. E se o Partido Democrático foi capaz de perceber a oportunidade que tinha pela frente quando se abriu ao exterior com as primárias que escolheram Bersani, falhou a chamada, não sendo capaz de interpretar os anseios dos cidadãos e aquilo que o seu próprio posicionamento ideológico lhe exigiram, quando teve de explicar ao que vinha. Tendo em que conta que muitos dos eleitores de Beppe Grillo se consideram de esquerda, mais evidente se torna o desafio e o drama para Bersani.
Do outro lado, por muito que estivesse várias vezes anunciada a sua morte, o populismo camaleónico de Berlusconi - hoje anti-austeritário, amanhã o que for necessário - não só não desaparece como se reinventa, sobrevive às evidentes fragilidades de credibilidade e honorabilidade do seu chefe e continua a mobilizar quase um terço do eleitorado. Sem vergonha e sem ideias que não o regresso ao poder, Il Cavaliere personifica o pior que a Itália neste momento oferece de retrato de um sistema exausto, sem ser sequer necessário puxar pela crítica fácil e moraleira ao bunga-bunga. Antes fosse esse o único mal de Berlusconi...
O único vencedor, Beppe Grillo, conquistando um quarto do eleitorado, deixa antever a principal necessidade de reflexão que de Itália se retira para toda a Europa. Quando os actores políticos se fecham sobre si mesmos e se absorvem no seu mundo impermeável ao sofrimento das pessoas, quando não conseguem afastar a percepção de que se vêem como uma casta e não oferecem soluções dignas, estão a formular um convite à grillização do sistema, ao aproveitamento das incertezas para o populismo anti-sistema, que não tem rosto de esquerda, nem de direita e namora todos os descontentes. É um caminho que pode mesmo, em casos extremos, tornar-se inimigo da subsistência de uma democracia de qualidade. Estaremos tão imunes a uma evolução destas como pensamos? 
E, finalmente, o prestígio internacional de Monti, mais do que uma mais-valia representou o carimbo que motivou a sua rejeição pelos eleitores. As desastradas tentativas externas de o vender como o garante da estabilidade, em que uma entrevista do Ministro das Finanças alemão a um periódico italiano foi a eloquente ilustração do desastre comunicativo patente nesta estratégia prestigiadora, contribuiram sim para confirmar que continuaria a ser o rosto da austeridade. Com estes amigos, nem foi preciso puxar pela conexão Goldman Sachs, o sr. Schäuble tratou de tudo com meia dúzia de elogios...
 

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publicado às 00:05

Manifestação de Sábado, dia 2 de Março

por Duarte Cordeiro, em 26.02.13



Eu vou!

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publicado às 18:00

Admirável Mundo Novo

por Catarina Marcelino, em 26.02.13

 

"A revolução verdadeiramente revolucionária realizar-se-á não no mundo exterior, mas na alma e na
carne dos seres humanos."

Aldous Huxley

 

Aqueles que estão convictos de que têm o poder e o país nas mãos, acompanham o novo paradigma com uma encenação para “gente estúpida”, olhando para o povo com soberba e arrogância, e lá vão trilhando o percurso para o desmantelamento do Estado Social e de desregularização do mercado de trabalho, na esperança de alterar a Constituição e a partir daí, ter o caminho totalmente livre para que a doutrina se instale e o “novo futuro” emerja pela mão desta “elite de iluminados”.

 

Esta nova classe emergente no poder, que mistura estes fundamentalistas neo-liberais com a arrogância dos herdeiros dos senhores dos tempos da ditadura, que nunca conviveram bem com a melhoria de vida de todos os cidadãos e do direito de todos a adquirirem uma licenciatura, as férias, o carro, a casa, vêm aqui a grande oportunidade de empurrar a classe média que emergiu com a democracia, para aquele que verdadeiramente entendem que é o seu lugar – a pobreza envergonhada dos remediados que comem e calam e que, como disse o banqueiro Fernando Urlich, membro da casta e emissário da superioridade da elite - ai aguenta, aguenta!.


Este caminho que se faz com a “brutal subida de impostos” de Passos e Gaspar, dos cortes dos subsídios de férias, da desvalorização do trabalho à custa do desemprego  e da emigração, mina a confiança, mina a esperança, cria desalento e posiciona os portugueses e as portuguesas para serem subjugados por quem manda.

 

Mas é bom que esta elite de “new age” misturada com “aristocracia da treta”, que se julgam acima dos outros, compreenda que o povo, mesmo espartilhado, um dia enche. E nesse dia veremos o que pode acontecer ao “admirável mundo novo”.

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publicado às 10:53

Da espuma dos dias

por Pedro Vaz, em 26.02.13

O Ministro "Álvaro" não pára de surpreender. Foi a Londres dizer que Portugal é amigo do investimento (SIC!)!!!!! Disse-o aquando do exercício das suas novas funções governativas - Agente Imobiliário.

 

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publicado às 08:55

Legitimação

por Bruno Adrego Maia, em 26.02.13

Declarações de Eduardo Catroga: "No dia em que se inicia a sétima avaliação da "troika", o economista Eduardo Catroga diz que o Governo tem de dispensar funcionários públicos e alterar a idade da reforma(http://www.tsf.pt/PaginaInicial/Economia/Interior.aspx?content_id=3072968).

 

Relatório encomendado pelo Governo ao FMI "RETHINKING THE STATE—SELECTED EXPENDITURE REFORM OPTIONS": "The government’s spending reduction target can only be achieved by focusing on major budget items, particularly the government wage bill and pension spending".

 

A legitimação da solução começa. Falta António Borges vir elogiar.

 

Quando atingimos valores de desemprego históricos, criar mais desemprego (e tendencialmente de longa duração) parece fazer todo o sentido...

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publicado às 08:53

Equipa de Seara

por Filipe Bacelar, em 25.02.13

Depois de Futre ter assumido receber um convite para se candidatar à Junta de Freguesia de Campolide na lista do Seara, estou em condições de anunciar o resto da equipa:

Neno no Lumiar;


Quarteto defensivo composto por Augusto Inácio e Álvaro Magalhães em Alvadade e Alcântara; Eurico em Marvila ficando Venâncio para  a Ajuda;

No meio campo vai alinhar Petit no Areeiro, Frasco nas Avenidas Novas e Rui Costa em Arroios;

 


A frente de ataque foi confiada a Futre em Campolide; Paneira no Beato e Eusébio em Benfica.


A táctica está dada...

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publicado às 15:00

Soft Opening

por Pedro Vaz, em 25.02.13

“(...)O país perdeu a inteligência e a consciência moral. Os costumes estão dissolvidos, as consciências em debandada, os carácteres corrompidos. A prática da vida tem por única direcção a conveniência. Não há princípio que não seja desmentido. Não há instituição que não seja escarnecida. Ninguém se respeita. Não há nenhuma solidariedade entre os cidadãos. Ninguém crê na honestidade dos homens públicos. Alguns agiotas felizes exploram. A classe média abate-se progressivamente na imbecilidade e na inércia. O povo está na miséria. Os serviços públicos são abandonados a uma rotina dormente. O Estado é considerado na sua acção fiscal como um ladrão e tratado como um inimigo. A certeza deste rebaixamento invadiu todas as consciências. Diz-se por toda a parte: o país está perdido!Neste salve-se quem puder a burguesia proprietária de casas explora o aluguel. A agiotagem explora o juro…(…)

 

Queiroz, Eça, Uma Campanha Alegre (1890)


Actual, Não?!

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publicado às 10:02

Linguagem Filibusteira

por David Areias, em 25.02.13
Roubam-me a voz
quando me calo
ou o silêncio
mesmo se falo

Jorge de Sena


Há uma linguagem que nos prende. Aparentemente inteligente e cheia de significado, cujo uso rapidamente se generaliza, não chega a ser questionada. Uma linguagem trazida para o discurso político que ora parece ter origem nos mais altos estudos técnicos (as reformas estruturais, os modelos de desenvolvimento, as posições economicistas...), ora nas mais inopinadas metáforas (o peso do Estado e as suas gorduras, qual suíno). Uma linguagem remissiva, que se autoriza em estudos, pareceres, memorandos, auditorias, relatórios.

Por norma, o recurso a essa linguagem serve apenas um propósito: aparentar um alto nível discursivo e argumentativo, quando na realidade nada se discute e se impede a discussão.

O que se diz na realidade quando, por exemplo, se diz que a justiça precisa de uma reforma estrutural? Se se quer apenas dizer que é preciso corrigir o que está errado, não há quem discorde. Mas porque não se fala então naquilo que está errado? De forma inocente, por desconhecimento. De forma culposa, para esconder o que realmente se pretende dizer e reformar.

Trata-se do esvaziamento das palavras políticas, que infectou conceitos e ideias que julgávamos ter firmes no espírito colectivo. Serviço nacional de saúde universal, ensino básico universal, obrigatório e gratuito. Estado social. Subordinação do poder económico ao poder político democrático. Igualdade. Democracia.

Tudo se transforma, enfim, numa linguagem filibusteira. Atrapalha, cansa, impede a discussão. É preciso recuperar as palavras.

É preciso reencontrar as perguntas certas, as mais simples, ainda que de resposta difícil: são verdadeiros os pressupostos de decisão política? a decisão política é a mais justa?

Afinal, com que armas discutiremos e lutaremos quando esvaziarmos as palavras?

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publicado às 09:14

Palavras Iniciais

por filibuster, em 25.02.13

A principal constatação que esteve na origem deste blogue passa pelo facto de os tempos que atravessamos não serem tempos como os outros. Aquilo que tomávamos por adquirido quanto ao nosso Estado social, à saúde da nossa democracia e ao destino do projecto europeu é hoje posto em causa todos os dias, sem que o debate público de ideias em torno deste desafio corresponda aos mínimos olímpicos que se exigiriam. Os cidadãos estão cada mais descrentes dos seus representantes, os seus representantes estão cada vez mais absorvidos pela bolha virtual e mediatizada que rodeia os espaços do poder e o conjunto do País empobrece, vítima de estratégias desconexas da realidade, esvaziadas de solidariedade e perdidas em contradições.

 

Alguns de nós, autores e autoras deste blogue, exercem funções públicas ou já as exerceram, outros têm tido graus variados de intervenção cívica ou associativa em vários momentos das suas vidas, mas todos partilhamos uma inquietação quanto ao rumo para o qual a nossa centenária República se encaminha e a convicção de que é nos valores da esquerda democrática e republicana que se encontram as soluções para os seus problemas. Sabemos também que padecemos de muitos dos males que diagnosticamos e não queremos fugir à crítica ou ao debate que a nossa própria humana imperfeição pode suscitar. Mas, acima de tudo, queremos usar este cantinho virtual para dizer presente a este debate, provocar outros a fazer o mesmo e explorar até ao máximo aquela que é das liberdades mais fundamentais nas sociedades democráticas: a da palavra!

 

E sem desmerecer outras tradições, a figura do Filibuster parlamentar, popularizada no contexto do Senado americano, mas  com pergaminhos igualmente dignos de nota noutros tempos da nossa própria história política, pareceu-nos traduzir o espírito do que pretendemos incutir à nossa intervenção.

 

Trata-se, acima de tudo, de uma forma de manifestar que o mais imprescindível é não deixar de falar, discutir ideias, insistindo nos valores que nos guiam e recusando compromissos e soluções artificiais nos princípios estruturantes. Claro que a opção pode também ser vista como uma gentil e provocatória ameaça de obstrução aos adversários, mas sendo a blogosfera um espaço de convívio plural prometemos que os nossos flibusteiros apenas pretendem afogar a vizinhança em argumentos (e dos bons!).

 

Finalmente, prometemos também não ficar obcecados apenas com a espuma dos dias do debate político, apontando para uma mistura bem mais rica em temas do que a nossa estética e nome poderiam denunciar (não esquecendo, porém, que uma das formas de manter um filibuster eficiente a durar várias horas, passa muitas vezes pela leitura integral de romances ou de antologias poéticas).

 

Esperamos que continuem a visitar-nos.

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publicado às 08:00





Filibuster, subs.

1. Utilização de tácticas de obstrução, tais como o uso prolongado da palavra, por membros de uma assembleia legislativa de forma a impedir a adopção de medidas ou a forçar uma decisão, através de meios que não violam tecnicamente os procedimentos devidos;

Filibuster, noun
1. The use of obstructive tactics, such as prolonged speaking, by a member of a legislative assembly to prevent the adoption of measure or to force a decision, in a way that does not technically contravene the required procedures;

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