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Nas habituais comemorações alusivas ao 25 de Abril na Assembleia da República, quando muitos esperavam o seu contrário, o Presidente da República assumiu um discurso concretizador das suas arreigadas convicções pessoais, conferindo uma clara moção de confiança ao actual Governo e às suas políticas penalizadores dos portugueses. Ao arrepio do que havia feito no discurso de ano novo, em que ficou patente a crítica à política económica conduzida pelo Ministro das Finanças, advertindo inclusive para o perigo da espiral recessiva, o PR optou por lançar sérios avisos àqueles que reclamam por uma inversão das políticas e, se necessário for, à necessidade de convocação de eleições antecipadas. Ora, este recado não é dirigido apenas e só aos partidos da esquerda parlamentar, mas também ao próprio parceiro de coligação e ao líder do PP (agora absentista de tomadas de posse de colegas de governo), como inclusive à própria ala cavaquista no interior do PSD. “ Não vão ser atingidos os objectivos definidos e o país chegará ao fim do programa destroçado”, ou “Não sei se a ideia é fechar o país”, foram afirmações contundentes proferidas, respectivamente, por Manuela Ferreira Leite e por Rui Rio, conotados como próximos do próprio, pelo que o discurso de ontem serve de igual sorte para refrear os ânimos no interior do partido do Presidente e da sua entourage.
Se dúvidas houvesse quanto à capacidade de isenção e imparcialidade do actual PR, após o discurso de ontem, arrisco-me a dizer que as mesmas se dissiparam até na mente dos mais cépticos. A partir de ontem, passamos a uma nova fase da política portuguesa, digamos que aquela invisível mão deixou de estar escondida por detrás dos arbustos, passando a ser visível aos olhos de todos. E não estou obviamente a referir-me à miraculosa mão invisível de Adam Smith, dos fervorosos adeptos liberais.
O PR assumiu de vez a liderança partilhada do Governo, pese embora não saibamos bem ainda o cargo que lhe está destinado neste PREC – Processo de Remodelação em Curso. Talvez Ministro-Adjunto ou mesmo a honra de Vice-Primeiro-Ministro…
Mas quem há dois anos atrás clamava por um sobressalto cívico num inadequado discurso de tomada de posse, circunstância que determinou o precipitado derrube do anterior Governo, mais dia menos dia, teria de ser consequente com as suas palavras e reassumir as desejadas funções governativas. Foram 10 anos de governo, é natural a nostalgia e o forte sentimento de regresso ao passado, que provocou emoções fortes e desmaios aquando da sua despedida.
Portanto, se me espanta esta posição de facção tomada pelo Senhor Presidente da República? Já nada me podia surpreender de quem há anos longínquos afirmou: “nunca me engano e raramente tenho dúvidas”, ou mais recentemente “para ser mais honesto do que eu tem de nascer duas vezes”. Para muitos poderá ter significado pouco, para mim revelou bem o carácter da pessoa em presença.
Doravante, e por sua iniciativa, a presidencial, o Prof. Cavaco Silva ficou amarrado ao Governo e inerentemente aos resultados das suas políticas.
Depois do meltdown do Partido Democrático italiano que conduziu à demissão de Bersani e à reeleição de Napolitano (no meio do caos, uma solução de alguma estabilidade, melhor do que as alternativas, mas que evidencia a impossibilidade total do sistema político italiano em se renovar), a dimensão do perigo e da irresponsabilidade do populismo de Beppe Grillo tornou-se mais evidente, na recusa da legitimidade da reeleição, nas alusões a um golpe de Estado e no apelo à necessidade de uma nova marcha sobre Roma (ciente do impacto simbólico das palavras que usou).
Hoje de manhã, surge a indigitação de Enrico Letta, n.º 2 do Partido Democrático, para formar governo, no que poderá ser um tripartido PD, Berlusconi e Monti, numa lógica de grande coligção para superar as crises. No entanto, parece-ne que o cheiro a eleições para breve não saiu do ar, num momento em que surge Berlusconi a liderar sondagens, o PD a cair e Grillo a sobreviver e a progredir.
Com duplo atraso (face à data da efeméride e às declarações, ou ausência delas), hesito quanto a quais as sugestões de leitura a fazer ao Presidente da República para o Dia Mundial do Livro. A partir de adaptações de um qualquer incógnito autor vencedor do Prémio Nobel da Literatura em 1998, poderíamos pensar no "Ensaio sobre Cegueira (Literária)" ou em "(Quase) Todos os Nomes".
Apesar da omissão ter ocorrido num quadro de um périplo pelo exterior, "A viagem do Elefante" é que seguramente não seria uma sugestão adequada. Uma memória de elefante não permitiria que se esquecesse Saramago...
É hoje lançada esta obra que retrata as atrocidades cometidas pelo Estado Novo aos presos políticos enquanto estavam encarcerados.
Segundo a autora, Joana Pereira Bastos, jornalista do Expresso, a principal motivação para a publicação desta obra deve-se ao seguinte:
“Apercebi-me que as pessoas da minha geração têm um desconhecimento muito grande em relação ao que se passou então. Que têm a ideia de que a PIDE era uma polícia relativamente branda.”
Pertencendo à mesma geração da autora, e porque deparo-me igualmente inúmeras vezes com muita ignorância histórica, fica aqui esta sugestão de leitura por ser um dever não branquear os crimes perpetrados pela ditadura do Estado Novo. E para que a nossa e as gerações vindouras tenham sempre presente e, assim, não desejem sofrer na pele as chagas de uma ditadura.
Abril, mês da liberdade!
Três ex-líderes da JS, Pedro Nuno Santos, Duarte Cordeiro e Pedro Alves, defendem que o próximo congresso do PS clarifique a política de alianças, recusam entendimentos com a atual maioria PSD/CDS e querem uma solução à esquerda.
Estas posições foram assumidas pelos três anteriores líderes da Juventude Socialista (JS) Pedro Nuno Santos (2004/2008), Duarte Cordeiro (2008/2010) e Pedro Delgado Alves (2010/2012) em entrevista conjunta à agência Lusa, a uma semana do Congresso do PS.
Pedro Nuno Santos, Duarte Cordeiro e Pedro Alves foram líderes da JS durante os sete anos de liderança partidária de José Sócrates, são amigos e conotados com a ala esquerda dos socialistas.
"O congresso será um momento muito importante para o PS definir matérias que ainda carecem de debate, por exemplo a política de alianças. O PS tem pedido a antecipação das eleições, o PS combate sempre para conseguir maioria absoluta, mas também é importante que clarifique com quem está disponível para governar", sustenta Pedro Nuno Santos, líder do PS/Aveiro.
Na política de alianças, Pedro Nuno Santos diz que nem sequer lhe "passa pela cabeça que o PS possa governar com o PSD e o CDS".
"Por uma razão muito simples: Um Governo de salvação nacional deve retirar o país do buraco em que caiu e isso só se faz contra a direita, contra o PSD e o CDS. Julgo que deveria ser muito claro que o PS não entra em governos com o PSD e CDS", salienta.
O deputado socialista Duarte Cordeiro considera que o PS decidiu "corretamente" apresentar uma moção de censura ao Governo e tem assumido um conjunto de ideias, "mas ainda está longe de apresentar uma solução global do ponto de vista do projeto político".
"Em alguns aspetos o PS tem de fazer mais, envolver mais, gerar mais confiança e isso passa pela necessidade de uma clarificação política, por ter a noção concreta sobre como, com quem e com que projeto se vai apresentar ao país", adverte.
Na perspetiva do ex-diretor da segunda campanha presidencial de Manuel Alegre, a prazo, é possível criar condições para entendimentos à esquerda.
"Se o PS tiver um projeto claro, tendo como objetivos a renegociação dos termos do ajustamento, parar com as políticas recessivas, estabilizar o desemprego, procurar folgas através da renegociação da dívida e de políticas ativas económicas para incentivar o crescimento, se estas políticas forem desenvolvidas, estou absolutamente convencido que não há espaço para o Bloco de Esquerda não suportar politicamente essas propostas. Não sei se o Bloco estará ou não em condições de apoiar um Governo PS, mas se o PS desenvolver este conjunto de propostas tornar-se-á muito difícil ao Bloco não apoiar", advoga.
Pedro Delgado Alves entende como "fundamental a existência de uma alternativa clara e de um discurso claro" no PS.
"Feito o trabalho de definição sobre o rumo para Portugal e para a Europa, a partir do momento em que o PS lidere o debate, depois a questão que se segue, referente às estratégias de aliança - e que é importante que seja colocada sem preconceitos em cima da mesa - deve ficar em aberto face a uma definição clara", defende.
Pedro Alves recusa que se coloque "um anátema na esquerda toda, como se fosse inimputável".
"Infelizmente, até hoje, nunca foi possível fazer o diálogo no plano da construção de um Governo, mas estamos perante uma emergência de tal ordem que a verdadeira responsabilidade do PS e dos outros partidos à nossa esquerda tem de exigir mais do que se construiu até agora. Os fantasmas do passado, os esqueletos nos armários, as histórias de partos difíceis da nossa democracia têm de ficar arrumadas no passado e temos de olhar em frente", afirma.
No espaço político para potenciais convergências, este docente universitário, inclui também setores progressistas sociais-democratas do PSD ou democratas-cristãos do CDS.
"Há sempre espaço para todos poderem colaborar num momento de salvação nacional. Não gosto de ser tremendista, mas o país nunca enfrentou um desafio como o que enfrenta hoje, com uma escalada de dificuldades no plano económico e a descredibilização dos principais agentes políticos", acrescenta.
Há 40 anos atrás era fundado, na cidade na cidade alemã de Bad Münstereifel, o Partido Socialista: "Ponderando os superiores interesses da Pátria, a actual estrutura e dimensão do movimento, as exigências concretas do presente e a necessidade de dinamizar os militantes para as grandes tarefas do futuro, deliberou transformar a Acção Socialista Portuguesa em Partido Socialista.”
Considerado como o partido referência do regime democrático decorrente do 25 de Abril, o PS esteve sempre ao comando dos valores da liberdade, da tolerância, da igualdade de oportunidades e da fraternidade, procurando a realização destes valores em medidas concretas que visassem no essencial uma sociedade aberta, progressista, justa e solidária.
Numa época em que atravessamos tempos de enormes dificuldades, em que muito do que foi proposto e conquistado pelo próprio PS na construção do Estado social é colocado quotidianamente em causa, o PS tarda em assumir uma postura contundente face às exigências do momento e apresentar-se como uma alternativa clara com um projecto político mobilizador da sociedade civil. O tempo urge e o PS deve liderar as reformas que se impõem para dar resposta aos anseios dos portugueses.
Ou é agora que faz jus à sua história, ou ficará irremediavelmente comprometido com estas políticas e com esta saturada forma de fazer política em Portugal.
Sem prejuízo de voltar detalhadamente ao tema mais tarde, algo que tenho vindo a adiar há algumas semanas, não posso deixar de sublinhar a clareza da intervenção hoje de Guy Verhofstadt no Parlamento Europeu, perante a transigência da direita parlamentar: é preciso coragem das instituições europeias para fazer frente às transformações anti-democráticas e cerceadoras do pluarlismo, em curso pela mão do Governo de Viktor Orban na Hungria, não podendo excluir-se um procedimento por violação dos Tratados em matéria de garantia dos princípios democráticos.
Depois do Uruguai na semana passada, agora a Nova Zelândia junta-se aos países que legalizaram o casamento entre pessoas do mesmo sexo. O caminho faz-se caminhando, mas dá gosto ver tanta gente a caminhar junta.
Passos Coelho convidou António José Seguro para dançar o tango. O Primeiro-Ministro fez questão de endereçar o convite de forma solene mediante o envio de uma carta, tendo inclusivamente feito questão de dar conhecimento público do teor da mesma. Não é de todo inocente a mensagem política que pretende passar.
Após elevar a fasquia com a apresentação da moção de censura e promessas de ruptura (total!?) com o Governo, aguarda-se pela réplica do Secretário-Geral do PS.
Será que se deixa enredar pela novel estratégia gizada por este governo de iniciativa presidencial?
Raúl Rêgo faria hoje 100 anos.
O Governo anunciou em Carta à Troika que vai proceder à aproximação salarial e acabar com outras regalias dos funcionários públicos. Como elegeu os juízes e os professores universitários como parte da primeira leva de reduções, presumo que um juíz no sector privado deve ganhar muito menos do que um juíz no sector público...
Adenda: Um amigo meu sublinhava hoje no Facebook de manhã, a propósito desta notícia, a feliz coincidência de serem precisamente juízes e professores universitários que integram o Tribunal Constitucional.
Andava há dias para escrever sobre o Programa do Governo Impulso Jovem e o embuste que o mesmo é.
Mas o Governo da República decidiu dizer-nos a todos o que verdadeiramente entende sobre a sua importância ao extingui-lo.
Quem acha que perdeu uma coisa não sabe que a pode usar, nem sabe como.
E por isso quando um Primeiro Ministro diz no Parlamento que o país perdeu a soberania, o amargo de boca é nosso: isso é não saber o que é um país, nem saber o que é a soberania.
Felizmente o Tribunal Constitucional sabe e ensina-o ao Primeiro-Ministro.
A República Portuguesa é um Estado de Direito. O Tribunal Constitucional volta a afirmá-lo e a assegurá-lo, pela segunda vez em dois anos. Subscrevi por duas vezes o pedido de fiscalização, mesmo quando poucos eram os que faziam fé na possibilidade da resposta vir do respeito e da defesa da Constituição, mesmo quando a pressão para o não fazer era real. Foram dos actos mais relevantes que tive oportunidade de praticar na minha vida cívica.
Começa a parecer cada vez mais claro que, mais do que o XIX Governo Constitucional, este é capaz de ser o I Governo Inconstitucional...
Enquanto enchem chouriços aguardando pela decisão, algumas televisões multiplicam comentadores sobre questões de constitucionalidade que vão revelando coisas notáveis:
a) Que não leram as duas decisões anteriores do Tribunal Constitucional sobre a mesma matéria e que alegam estar a comentar;
b) Que dizem discordar do texto constitucional que temos e que o Tribunal está, infelizmente, obrigado a aplicar, esquecendo, como aqui há uns dias escrevi, que os fundamentos da decisão do TC do ano passado assentaram na defesa do princípio da igualdade e da protecção da confiança (sovietices, como sabemos).
c) Que é possível emaranhar numa mesma frase o regular funcionamento das instituições, o estado de sítio e de emergência e o momento de excepcionalidade em que estamos.
Bem sei que é sexta-feira, mas caramba....
PS: É só a mim que me faz confusão o Tribunal marcar a leitura do Acórdão para a hora de abertura dos telejornais?
Na conferência de imprensa da partida, Relvas procurou mostrar que deixou algum legado na sua passagem pelo executivo. "A História me julgará" terá dito. Assim será. No entanto, tenho a certeza de que os histroriadores de amanhã não ignorarão o ministro que recebia SMS com informações recolhidas e tratadas por um antigo agente e dirigente dos Serviços de Informações com uma transição pouco clara para o sector privado, não esquecerão o titular da pasta da comunicação social que exerceu pressões directas sobre um diário, através de ameaças de revelações da vida privada de uma jornalista, nem deixarão de reportar o caso da licenciatura como um factor emblemático na imagem pública que ficará do ministro demissionário.
Mesmo no balanço da sua actividade governativa, pesará a infeciência absoluta de um programa de incentivo ao emprego jovem que não conseguiu alcançar uma taxa de execução sequer próxima dos 10%, uma reforma do mapa da administração do território construído sem qualquer estudo relevante, contra o bom senso, ignorando os contributos das populações e assente em negociatas de benefícios para quem se aceitasse agregar, e ainda registará uma total incapacidade de concretizar um plano para o futuro do serviço público de televisão, oscilando entre anúncios cacofónicos de privatizações, concessões, fecho de um canal, e outras ideias com a esperança de vida de um fogo-fátuo e com a consistência de gelatina que ficou esquecida ao sol.
No entanto, num outro plano, Miguel Relvas representa uma outra falência, bem mais grave, de toda a nossa Democracia, precisamente o que afasta as pessoas da intervenção política e ajuda a cavar o fosso entre os cidadãos e os seus representantes. Chico-espertismo de ocasião, inconsistência de valores e ideias, ausência de credenciais académicas mínimas, percursos profissionais inexistentes fora do quadro da actividade política ou partidária (ou quando emergentes, apenas tardiamente e devido àquela actividade e beneficiando das excelentes relações nela construídas), eis o perfil que nos é permitido observar há anos e que foi triunfando conforme a nossa vigilância e exigência colectiva se ia afrouxando. Miguel Relvas representa uma forma de intervir na vida política que foi determinante para deixar uma generalizada má reputação às juventudes partidárias, realidades imperfeitas como quaisquer construções humanas e em que se movem pessoas muito pouco recomendáveis, como em tantas outras organizações, mas que estão igualmente cheias de pessoas competentes, sérias e altruístas que merecem muito mais do que ser confundidas com o juízo caricatural e anatemizador que Relvas e os que apresentam percursos similares aos seus ajudaram a legar.
Como um amigo e colega muitas vezes tem dito, mesmo nestes tempos em que o discurso fácil de que todos os políticos são iguais faz escola, apesar de tudo os portugueses foram capazes de distinguir as diferenças entre os seus governantes. Foram capazes, por variadas formas, de exigir a Relvas que fosse estudar, que se demitisse, que tivesse vergonha na cara, que deixasse de poluir o nosso espaço público com a sua proverbial sonsice de quem acha que se pode juntar ao coro de quem protesta contra aqueles que lhes matam o futuro, procurando trautear inabilmente um hino de liberdade e revolta cuja letra nem consegue reproduzir.
Aproveitemos, pois, a partir daqui, para provar aos cidadãos que, de facto, quem se dedica à causa pública não se reconduz a um Relvas. Mas exijamo-nos a todos o envolvimento na causa pública, pois só isso pode impedir a sua proliferação - os Relvas não aparecem por acaso, aparecem quando baixamos as guardas, quando deixamos de nos preocupar, quando nos falta a paciência para derrotar a mesquinhez de quem anda na política para se safar. Custa? Sim, custa que se farta ter paciência e força de vontade para não desisitir. Mas quem lutou pela nossa Democracia e pela nossa República, e aqueles a quem as queremos legar, preservadas dos demónios que não hesitariam em pisá-las para se safar, exigem de nós esse esforço. E é mesmo um esforço, não se basta com discursos demagógico e antipartidos - implica estar disponível para lutar, perdendo por vezes, esperando por melhores dias outras vezes, mas nunca desistindo, nas instituições da nossa República, por essa limpeza. Não basta debitar pessimismos a partir do conforto dos sofás espalhados pelo País fora, esperando que o monstro morra sozinho - esse será sim, o caminho da morte certa da Democracia....
O dia de hoje, acima de tudo, pode representar uma higienização da República, através de uma nova exigência que se pode e tem de ter relativamente aos seus governantes. Ontem, num momento de menor optimismo, pus no Facebook uma frase de Jorge de Sena em que este afirma que "nada nos salva desta porra triste". Hoje, acho que talvez ainda haja esperança....
Já não há saco para as narrativas (permitam-me o abuso da expressão) sobre a fiscalização da constitucionalidade do Orçamento do Estado.
Em primeiro lugar, chega de pressões inaceitáveis do Governo e da maioria, degradando o respeito institucional, a separação de poderes e a inteligência de quem as proferiu. Desde a ameaça em surdina de crise política (entretanto abandonada, aparentemente), à ideia de que o Tribunal também está vinculado ao memorando, ensaiada por uma Deputada da maioria, por sinal jurista, tudo serviu para condicionar os conselheiros do Constitucional.
De forma bem mais autorizada do que as minhas linhas indignadas, o Prof. Jorge Miranda fez questão de enfatizar que assim não é, que assim não pode ser. Por muito que algumas pessoas no seio dos partidos da maioria pretendam usar o memorando para inverter os valores da nossa democracia e subverter o nosso quadro constitucional invocando um putativo estado de excepção, o que se tem de passar é exactamente o contrário: o Tribunal Constitucional tem por missão assegurar que o memorando não torpedeia o Estado de Direito e não espezinha o Estado social.
Depois, tem sido igualmente frequente e feroz a linha de quase insulto gratuito, como aquele debitado semanalmente por Marques Mendes quanto à falta de celeridade da decisão. Apesar do último dos vários pedidos ter entrado apenas no início de Fevereiro, apesar de o TC estar a reduzir todos os prazos habituais da fiscalização sucessiva e de ser expectável uma decisão ainda esta semana (quando o acórdão relativo ao OE 2012, em relação ao qual era bastante menos ampla a dimensão do pedido, foi apenas conhecida em Julho do ano passado), o Tribunal não escapa à injustiça de ser cunhado de lento e inconsciente da sua responsabilidade.
Por outro lado, temos ainda a argumentação primária de que o Tribunal será responsável por todos os males que advierem ao País caso o OE para 2012 seja declarado inconstitucional. Esta linha de pensamento, patente, por exemplo, aqui (combinada com ataques mesquinhos aos juizes) faz por esquecer o caminho que nos trouxe até aqui.
Senão vejamos: O Governo apresenta uma proposta de Orçamento de Estado que é potencialmente inconstitucional, havendo um histórico fresquinho de uma declaração de inconstitucionalidade de medidas similares. Alertas a este respeito não faltaram, de variados quadrantes políticos e juridicos. Pedidos de antecipação do calendário da discussão de forma a permitir uma fiscalização preventiva que dissipasse as dúvidas também foram reiterados. O Governo e a maioria insistem, aprovam o Orçamento apesar de tudo isto. O Presidente da República, qual Rick Moranis de Belém interpretando o papel principal num "Querida, eu encolhi a Presidência" com um guião fraquinho, passa olimpicamente ao lado da possibilidade de fiscalização preventiva que evitaria a incerteza e circunscreve-se a uma fiscalização sucessiva como mal menor.
Contudo, o culpado, o irresponsável, o destruidor de mundos, quem tem de ter cuidado com as suas decisões e sentir o peso do abismo que abriria, é o Tribunal Constitucional.
Finalmente, a última das diatribes, a que já nos vamos habituando de outras aventuras, é a que insiste no ataque à Constituição, aludindo a um seu carácter bolorento e ultrapassado. Mais uma vez, contudo, os autores desta abordagem fogem à realidade como o Diabo foge da cruz. Não será devido a qualquer enviesamento ideológico ou vontade de transição para o socialismo (que já há muito não integram o texto da Constituição), nem a uma qualquer violação de um plano quinquenal exigido pela nossa Constituição para-soviética que o Orçamento do Estado para 2012 se aproxima da inconstitucionalidade. O que foi alegado, na linha da anterior jurisprudência do Tribunal, é a apreciação da conformidade do OE com ideias tão ultrapassadas, radicais e dirigistas como o princípio da igualdade ou o princípio da protecção da confiança....
Felizmente, estará perto a decisão. Para além de esperar que contribua para salvaguardar o Estado de Direito, fica também a esperança de que ajude a meter muitas violas nos sacos respectivos e a acabar com a teatralização do Tribunal Constitucional como um alvo a abater.
Sobre o assunto, ler também este excelente texto do Domingos Farinho no Jugular.
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Facto é que o DUA é omisso no respeitante ao teor ...
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Agradeço a sua resposta. Não posso no entanto deix...
Dou de barato a demagogia de fazer a comparação en...