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Doutrina à la carte

por Pedro Delgado Alves, em 17.11.13

 

Normalmente é preciso esperar pela 2.ª feira para nos impressionarmos com o pensamento de João César das Neves.

Esta semana tivemos direito a um brinde antecipado, graças à entrevista que deu ao DN.

 

Apesar de aquilo que mais frequentemente provoca reações de espanto serem as posições assumidas pelo autor em matérias de costumes, igualdade de género ou liberdades fundamentais, revelando um alinhamento pelo pensamento mais conservador de alguns setores da Igreja em matéria de divórcio, de direitos LGBT ou da posição perante a IVG, para citar os mais frequentes tópicos (em que JCN surge até, por vezes, a sustentar posições mais conservadoras  daquela que é a posição oficial do Vaticano), hoje a intervenção que está a causar furor é no plano do pensamento político-económico.

 

Fica a ideia de que subir o salário mínimo (essa exorbitância de 485€) seria "estragar a vida dos pobres", bem como a noção (seguramente estruturada em dados fiáveis, como estes que a Raquel Varela publicou, num país com uma das maiores taxas de idosos abaixo do limiar da pobreza, antes do acesso a prestações sociais) de que a maior parte dos pensionistas "fingem que são pobres".

 

Sem prejuízo de um regresso a ambos os temas das afirmações, aproveito para apenas sublinhar, uma vez mais, a recorrente seletividade de JCN em matéria doutrinária que estas leituras evidenciam: sempre na linha da frente das guerras pelos costumes em defesa da visão mais ortodoxa disponível, mas conseguindo em simultâneo passar um manto diáfano de esquecimento por cima de toda a doutrina social da Igreja (em especial a parte estruturante sobre direitos do trabalhador, onde pontua de forma cristalina a ideia de justa remuneração). 

 

Não se pedia muito... Pelo menos uma maior atenção à tendência mais recente para a fixação de prioridades pelo Papa Francisco não lhe faria seguramente mal nenhum.

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publicado às 23:59



12 comentários

De Pedro Delgado Alves a 18.11.2013 às 15:56

O que está presentemente em discussão é o aumento do salário mínimo para 500 €. concretizando uma medida aprovada em concertação social no passado e que hoje merece acordo de sindicatos e de confederações patronais. E porquê? Precisamente porque o que está em causa não é uma exorbitância, é apenas a combinação de dois argumentos fundamentais: a garantia de um mínimo de subsistência condigna num momento de aumento significativo do custo de vida e a ideia (perigosa e revolucionária) de que o trabalho tem um custo que deve ser suportado por quem dele beneficia na sua atividade económica. Ninguém desconhece as dificuldades dos empresários, no entanto, pretender que sejam os trabalhadores que ganham os salários mínimos mais baixos da Europa a continuar a suportar sozinhos o contexto que atravessamos, como se devessem dar apenas graças ao facto de poderem trabalhar, independentemente da situação de quase exploração em que se possam encontrar é que parece ser digno de modelos de desenvolvimento selvagem, próprios do século XIX.
E, já agora, se o argumento da dignidade não chega, recordemos as vantagens para a economia de ter trabalhadores motivados, com capacidade de consumo acrescida para revitalizar o mercado interno, com capacidade de investirem no futuro dos seus dependentes, reforçando as suas qualificações, evitando problemas sociais acrescidos provocados pela quebra dos rendimentos.

De Mike Luz a 18.11.2013 às 16:14

Pedro Delgado Alves, há tanta coisa que foi negociada no passado - fruto de lutas de trabalhadores ao longo dos anos - que hoje em dia foi desconsiderada. Sobre "modelos de desenvolvimento selvagem, próprios do séc. XIX" sugiro-lhe - com toda a honestidade intelectual - a leitura de um pequeno livro "Centesimus Annus". Provavelmente chegará à conclusão que se trata de um qualquer manifesto comunista, retirará daí boas conclusões sobre a dignidade no trabalho. Contudo, foi escrito por um Papa - mas olhe que não é um livro católico-subversivo.

De Pedro Delgado Alves a 18.11.2013 às 19:19

Leu o post que escrevi e que motivou a conversa, em particular o penúltimo parágrafo? Parece-me que estamos a falar da mesma coisa... Aquilo a que acima de tudo estou aludir é precisamente à incoerência de JCN, que só se lembra das partes da doutrina católica que lhe interessam

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Filibuster, subs.

1. Utilização de tácticas de obstrução, tais como o uso prolongado da palavra, por membros de uma assembleia legislativa de forma a impedir a adopção de medidas ou a forçar uma decisão, através de meios que não violam tecnicamente os procedimentos devidos;

Filibuster, noun
1. The use of obstructive tactics, such as prolonged speaking, by a member of a legislative assembly to prevent the adoption of measure or to force a decision, in a way that does not technically contravene the required procedures;

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