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Chegou a hora!

por Nuno Félix, em 27.05.14

António Costa fez uma leitura correcta dos resultados da noite de ontem. Não terá sido a vitória anémica do Partido Socialista nem o discurso delirante do actual Secretário-Geral que o impeliram para a afirmação da alternativa, António Costa percebeu que numa altura em que a extrema direita avança por toda a Europa, não é tempo para mais esperas e indefinições, o discurso da solidariedade e da tolerância tem que ter lideranças forte e responsáveis. António Costa, que tem feito um excelente trabalho à frente da Câmara Municipal de Lisboa, será um líder da oposição muitíssimo mais forte do que o tem sido António José Seguro, e decorrentemente será um primeiro-ministro incomparavelmente mais competente do que o é Pedro Passos Coelho.

Mas antes de apanharmos as canas do foguetório será chegada a hora do PS se definir enquanto partido, e mostrar do que é ainda feito, ou nem por isso. É esperar para ver. Mas o avanço de António Costa é uma inquestionável boa noticia para o país.

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publicado às 15:15

Enfim Livre

por Nuno Félix, em 23.05.14

As ultimas semanas foram de uma serena angustia, de um desalento desconhecido, de uma desesperança indignada tolhida por uma cidadania solitária que me apagou de entusiasmos, e outras razões, em riscar a cruz em qualquer uma das quadriculas no boletim de voto de domingo.

A minha decisão estava tomada, ia VOTAR EM BRANCO!

Ainda assim, procurei algo, uma resposta certa a uma questão relevante, uma hipótese honesta, que mesmo que modesta, pode-se abrir uma nesga para a construção de uma solução.

Desabafei e desafinei, contestei, repostei, filibustei, simplesmente postei e recomentei comentários de que gostei e desgostei e por fim mudei.

O diagnóstico está feito, os noticiários de hoje abriram com as noticias de ontem. As caras dos nossos problemas são as que conhecemos bem. Um arco do poder cada vez mais flat.

Sou mais uma vitima da governação? Não. Sou um privilegiado, porque não caí no desemprego e posso viver acima do meu limiar de dignidade. Indigno seria até não assumir a responsabilidade que também tive por ter colaborado voluntária e voluntoriosamente na ultima legislatura do PS, e que acabou como todos sabemos.

Deixemos de lado os discursos de palavrosos pantemineiros profissionais,  a política são os resultados e o caminho que se percorreu para os atingir. Os resultados da governação e da oposição são miseráveis. Os esquemas político partidários de conquista e manutenção do poder, a própria retórica e praxis parlamentar feita de tacticismo e cínica cretinice, estão enquistados no seio dos grandes estruturas partidárias.   

Tenho hoje uma visão bem diferente do que são os partidos com assento  parlamentar e de quem são grande parte dos seus protagonistas. Eles são, cada um à sua maneira, parte do problema. É ouvi-los com paciência e atenção, para lá de um quotidiano demagogo e mediano nada subsiste, o aparelho, a estrutura, o corrupto e o controleiro têm sempre mais a perder do que a ganhar. O liberdade não passa por lá, mas pode passar por aqui.

Existe num entanto uma mensagem que é:

-       inclusiva;

-       incisiva;

-       informada;

-       inconformada;

-       aberta;

-       indiscreta

-       futurista

-       realista

Em toda a liberdade, descomprometida de quaisquer compromissos morais e formais anteriores, no domingo existe uma opção que somos livres de escolher. Votar, não votar, riscar muito ou pouco, certo ou errado, dobrar em quatro ou até amarrotar o pedaço de papel. O que fizer que poderá valer tudo ou nada mesmo, para aquele que será o nosso futuro colectivo.

Agradeço a todos os amigos com quem tenho dialogado nos últimos dias pelos  contributos generosos ou até apenas provocatórios para a reflexão interior que efetivamente fiz, para a leitura dos documentos que procurei.

Agradeço os reptos do Rui Tavares para me juntar a uma mudança que urge.

O Livre é um risco de PRD, de BE, de MES, mas quando estes movimentos políticos nasceram ainda havia esperança, o futuro parecia perto e luzia. Hoje o risco é nada fazermos, é não assumirmos o risco de escolher um voto que terá consequências efetivas individuais e colectivas porque sabemos que será consequente com aquilo que se propõe.

Este pais não é para novos altruísmos, o que desejo para ti, é o que mais quero para mim, para a minha família, e essencialmente para os meus filhos. Portugal e a Europa têm que voltar a ser espaços solidários de esperança na paz e na prosperidade.

O VOTO NO LIVRE, é libertador e ao mesmo tempo revelador.

Libertador porque liberta-nos de preconceitos alicerçados na credibilidade institucional das outras opções partidárias que conhecemos de momentos anteriores a esta campanha.

Revelador porque expõe ao ridículo o quão condicionados estamos pelo discurso dominante, das inevitabilidades pró e contra o status quo.

Quem tem medo do ridículo da insignificância não fará este caminho. Mas aqui haverá nova revelação, quem votar Livre apenas quererá reconquistar a sua liberdade e não terá a extensa agenda de vergonhas e egoísmos das grandes máquinas partidárias a amarrarem-lhe o orgulho no seu sonho que cada um de nós fará por materializar o melhor que souber.

Domingo, dia 25, podemos partir de uma folha em branco mas com tanta coisa responsável e exequível já lá escrita, votando numa nova abordagem à política nacional e Europeia.

Hoje não consigo encontra uma única razão para não desejar que Rui Tavares continue no Parlamento Europeu e que um novo espaço de diálogo cresça à esquerda, e fortaleça uma esquerda democrática e responsável.

Por todas as razões que tive oportunidade de contrastar vou votar Livre. E para aqueles que, por ventura por razões semelhantes às minhas, se preparavam para votar branco, ou nulo, ou sequer para nem comparecer a esta votação, apenas vos peço que visitem o site do Livre, que  e reflitam individual e/ou colectivamente como eu o fiz e que por fim decidam votar a favor de ideias positivas, com futuro, abertas ao contributo de todos nós, portugueses solidários e comprometidos consigo e com o outro.

Forte abraço, e de novo obrigado, que mais não seja por honrares com a tua leitura as experiencias e ideias que aqui partilhei.

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publicado às 23:28

40 anos depois o 25 de Abril de 1974 falhou.

por Nuno Félix, em 15.04.14

Segundo dados do INE existem mais de 1,9 milhões portugueses em risco de pobreza e a crise arrastou mais 35 mil crianças para uma situação de carência alimentar.

Só no ano passado cerca de 120 mil crianças teriam passado fome se não tivessem o apoio do Banco Alimentar, um aumento de mais de 35 mil crianças face ao registado antes da crise, em 2008. O número foi cedido ao DN pela presidente da instituição, Isabel Jonet, que garante que um terço das 355 749 pessoas que receberam alimentos do Banco Alimentar contra a Fome em 2013 são crianças.

 

A descolonização portuguesa, eufemismo para abandono, originou guerras civis e fome em todas as ex-colónias que, com excepção de Cabo Verde, 40 anos depois, continuam a pertencer ao clube do 3ª Mundo, governadas por elites corruptas e violentas travestidas de democracias e sustentadas internacionalmente com a cooperação activa de Lisboa.

Economicamente, em termos relativos, Portugal continua na cauda Europa. O individamento externo em termos absolutos é extremo. O crescimento continua anémico. O desemprego, esse sim, duplicou, triplicou, quadriplicou… A emigração forçada voltou.

As famílias para as quais sempre esteve tudo bem, são as mesmíssimas do "antigamente", as outras estão sob um rolo compressor fiscal e o Estado Social a caminha silenciosamente para a iniquidade. A comunicação social tem dono(s) e não arrisca a sobrevivencia com vâs denuncias dos abusos de quem pode abusar sem ser verdadeiramente incomodada pela 2ª justiça mais lenta da UE.

Internacionalmente evoluímos de derradeiro império colonial europeu orgulhosamente só, para PIIG bom aluno sob protectorado. Sequestrados pelos nossos credores que nos administram via politicos coolaboracionisas com forças que antagonizam com o interesse nacional.

Politicamente, o regime está falido. A democracia representativa não representa mais do que instituições fechadas à sociedade, que investem a maior parte dos seus recursos na mera manutenção e perpectuação no poder e na prosperidade dos seus protagonistas. O bem comum pode sempre esperar.

Perdoem-me se não celebro o facto de não ser preso amanhã por publicar e assinar este texto. A liberdade de expressão é pifia consolação para tudo o que “inconseguimos”.

40 anos depois o 25 de Abril falhou, senão para todos, pelo menos para 120 mil crianças, e pela fome de 120 mil crianças quem vendeu a alma?

 

 

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publicado às 04:07

Tribunal do Investimento, Tribunal do Consentimento, Tribunal da Capitulação.

por Nuno Félix, em 10.02.14

O Estado vende empresas públicas com interesse estratégico para o país que garantem serviços essenciais aos cidadãos.

São empresas com um futuro promissor e que operam em áreas de actividade com garantia de procura estável (tantas vezes em posição monopolista).

O Estado vende-as a preço de retalho e não vê a quem. Parece não interessar que a nossa energia e a nossa banca seguradora passem para as mãos de outro Estado soberano que antagoniza com o nosso modelo de Estado de Direito, ou que até, em grande medida, o ameaça.

Para que este capital venha a correr e a saltar, criam-se pacotes fiscais a la carte, permitindo transferências de capital com total isenção de impostos, dá-se garantia política a multimilionários do Comité Central do Partido Comunista da República Popular da China cuja única contribuição para a economia portuguesa será a TSU (enquanto não substituírem os trabalhadores por computadores e robôs made in PRC) e um IRC recentemente trabalhado para contribuir com um valor baixíssimo para o todo da receita fiscal, graças a uma engenharia jurídica que beneficia as empresas que efectivamente podem pagar este imposto. Mas para o Presidente da Three Gorges, recentemente recebido discretamente pelo Presidente da República em Belém, tal não é suficiente.

 

É sabido, temos a segunda justiça mais lenta da Europa (só superada pela italiana), e os nossos legisladores sofrem de uma incontinência abundante quanto à legislação fiscal diz respeito. Por tudo isto a Justiça, ou falta dela, é uma das principais razões para se investir noutro país qualquer. No contexto económico português, a Justiça é “má moeda”. O que fazer?

Para apreciar os conflitos emergentes das relações contratuais onde está envolvido investimento estrangeiro aparece agora a inaudita ideia de criar um tribunal com uma competência especializada, um tribunal do investimento.

Ora convenhamos, para uma maior atractividade ao investimento, do que necessitamos é de simplificação, equidade, estabilidade e celeridade, não devemos provocar novos factores que distorçam a igualdade de acesso e tratamento pela justiça!

 

É discurso recorrente da governação e da oposição que urge uma reforma profunda do sistema judicial. Então porquê complexificar a estrutura do mapa judicial com a criação de tribunais especiais? Precisa o grande capital estrangeiro - que não tem face, não conhece pátria, e que vai com a mesma facilidade com que veio - de uma discriminação positiva por parte da justiça portuguesa? De uma discriminação positiva relativamente às descapitalizadas (financeira e humanamente) PME`s nacionais? Precisam as grandes e ricas multinacionais estrangeiras de uma justiça mais célere e simplificada do que aquela a que tem acesso as nossas PME`s? E lembradas as nossas PME`s, será necessário relembrar, principalmente à esquerda, que o grande contributo para o emprego nacional vem das PME nacionais e que por isso memso não devemos induzir fatores que distorçam a concorrência, nomeadamente no equitativo acesso à justiça e na igualdade de critérios de julgamento?

 

Vendo melhor esta ideia até que nem é nova, e faz lembrar os tribunais exclusivos para os cidadãos britânicos nos tempos em que estávamos sob protectorado, sem nobreza (a banhos no Brasil), sem exército, sem Vinho do Porto, sem lã, sem mármore, sem cobre, sem salgema ou quaisquer outras riquezas que produzíssemos e que os nossos aliados diligentemente expatriavam a troco de meia dúzia de Winchesters.

 

Claro que logo se ressalva que a futura instituição também deveria dedicar-se a julgar processos com empresas portuguesas, dependendo das verbas envolvidas (se for muita pasta), algo que seria definido consoante o contexto económico (PIB e deficit orçamental), por exemplo anualmente.

Mas estaremos todos a ver mal ou aqui fica a sugestão de que as próprias regras de acesso a este tratamento especial por parte da justiça devem estar sujeitas ao jeito que esta justiça especial pode dar às contas do Estado, e dos maiores inverstidores potenciais, conforme as contas da execução orçamental ou o fecho do índice PSI 20?

 

A capitulação da política face à economia é já hoje uma banalidade,  novidade é a disponibilidade da esquerda para a institucionalizar, pela submissão do próprio aparelho judiciário ao interesse económico mais imediato.

 

Não existe um caminho ínvio para se ser recto com os princípios e valores que se diz defender, e em particular não existe uma terceira via para se ter uma justiça igual para todos.

 

 

 

 

 

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publicado às 18:09

É mais fácil um Camilo passar pelo buraco de uma agulha, do que a TVI entrar no Reino dos Céus.

por Nuno Félix, em 10.02.14

“- Cristina, o Secretário de Estado disse-me que se tu tiveres um filho com uma deficiência de 60%, para além dos setecentos e tal euros que podes deduzir em despesas de saúde por esse dependente, podes também deduzir, sem qualquer limite, todas as despesas que faças com fisioterapia, próteses, outros tratamentos...”

“- Mas Camilo os abonos foram retirados...”

“- Sim Cristina, é para estes casos que as pessoas que andam sempre a vomitar Estado Social deviam olhar! Mas em todo o caso, devo acalmar as pessoas lá em casa, e que têm dependentes nesta situação, que todas as despesas que fizerem com estes podem ser deduzidas em sede de IRS até um limite de 30%.”

“- Mas Camilo, primeiro têm que ter o dinheiro?”

“- Sim Cristina, esse é um problema de liquidez das famílias, mas isso levava-nos a outra conversa...”

“- Obrigado Camilo por mais uma vez nos teres ajudado a explicar às pessoas lá em casa estas questões mais complicadas. E agora seguimos para o nosso telefonema surpresa, e esta manhã estão em jogo 10.000 euros!!!”

 

Canal Parlamento para quê?

Para o inconseguimento?!

Camilo nas manhãs da TVI é que é!

Portugal segue depois deste intervalo para compromissos publicitários.

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publicado às 12:32

Aprecio Miró. (ponto)

por Nuno Félix, em 07.02.14

Não é relevante para a República se o seu Presidente tem esta ou aquela inclinação estética, e em particular de aprecia, ou não, Miró "como pintor". Diz o povo português na sua secular cultura de tolerância que "gostos não se discutem", muito embora a falta de gosto de alguns seja indiscutível. Mas não deixa de ser curioso que Cavaco Silva tenha tido o cuidado de enunciar a qualidade particular em que o aprecia o catalão. Podia ter dito simplesmente "aprecio Miró", mas o cuidadosa formulção na resposta "-Aprecio Miró como pintor" vinda da boca de quem vem, não é despicienda.
E, chegados aqui, é legitimo levantar uma questão bem mais relevante, embora especulativa de certo, até porque permanecerá sem resposta, pelo punho ou boca do próprio.

A questão que releva é a seguinte:
Cavaco Silva apreciará Miró de igual modo como catalão repúblicano e resistente anti-franquista?

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publicado às 15:34

Adeus tristeza até depois...

por Nuno Félix, em 07.02.14

"Regressei há dias do Brasil, para onde agora vou viver e trabalhar. Uma coisa não vai sem a outra, e a vida aqui no meu País, ao fim de 50 anos de profissão tornou-se impossível, sem trabalho. Mas vou sem amargura, sem tristeza; a vida ensina que enquanto houver caminho...Ou então, talvez melhor, como diz o Poeta: "Caminhante não há caminho, faz-se o caminho ao andar." Quero partilhar com todos vocês o entusiasmo e alegria que sinto nestes dias antes da partida, dos apoios que tenho recebido de cá e de lá, e dizer-vos também que nada na vida é definitivo, a menos que falemos da morte. Faço música quase todos os dias, escrevo, reformulo, penso e repenso no meu trabalho e numa obra que só me honra, por saber de todos aqueles que foram indispensáveis para que eu conseguisse essa coisa maravilhosa que é chegar aos 65 anos e estar cheio de força e confiança para continuar. Sou o primeiro a entender que meio século de actividade e exposição pública são coisas que saturam o público, e é sem qualquer azedume que aceito que há outras pessoas e imagens que o mesmo público agora deseja. Nunca poderei agradecer o amor incondicional que ao longo de meio século milhares de pessoas me deram, nada pedindo em troca que não fosse mais uma cantiga, a única coisa que aprendi a fazer decentemente toda a minha vida.
Estaremos sempre por aqui, em contacto, e eu com esperança de conseguir divulgar um pouco mais e melhor uma Cultura que inventámos e que nunca promovemos: a Canção feita em Portugal.
Muitos brasileiros me desejaram pessoalmente as boas vindas, mal sabendo eles que vocês vão todos comigo. Fernando Tordo"

 

E assim quem não se aposenta, se ausenta. Mas com 65 anos de idade!? Teimoso o bardo que teima em não seguir os exemplos que excretam de cima... Pode a nação ganhar a guerra quando o chefe vai para o campo de batalha calçado nas pantufas do pensionista, e o trovador vai moralizar às tropas do outro lado do oceano?!

Pode o confidente do poeta não seguir num crescente confronto com a sua memória, ao perceber que já não dá baile aos PIDE´s que julgaram "A tourada" como uma ode à mais reaccionária das tradições, e que com a complacencia de outrora compagnons de route, a batuta do maestro retornou às mãos dos fiéis herdeiros dos algozes da liberdade?!

São velhos os novos horizontes que cantam, glorificados na forma de sorteio fiscal de carros de luxo para quem não tem dinheiro para pagar a casa ao banco. E que podemos dizer nós ao velho libertário que recusa coadoptar a ladainha do desfiar das contas deste rosário?

Talvez qualquer coisa parecida com:

- Vai Fernando, e faz feliz por lá os portugueses que te precederam. Esta laranja amarga e doce teu poema espremida até à última gota de talento, pátria que pariu a pátria de Gabriel O Pensador, jamais reinventará episódio tão expectacular como o Brasil. Único lugar no mundo lusófono onda o lema "Ordem e Progresso" não obriga a uma rima com billete de ida sem data de regresso. O Brasil, finalmente, parece estar a cumprir o seu ideal. Francisco Buarque de Holanda em 1974 pensou o mesmo de Portugal. Pensou mal.

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publicado às 10:29

Miró não é cocó, totó!

por Nuno Félix, em 05.02.14

Criou o CPAI (Clube Português de Artes e Ideias) e depois passagou pela vereação do agora preso Isaltino de Morais... o roteiro de um deserdado da sorte em busca do seu lugar ao Sol, melhor ainda se à sombra de alguém mais luminoso do que o sombrio reflexo da sua própria imagem. Compreende-se que, para quem queria ser reconhecido pela cultura, não seja facil ser confundido com um vendedor de auto-rádios da Praça de Espanha. Mas à rectidão de um caminho difícil preferiu o redondo dos óculos de massa com as lentes fundo de garrafa que lhe emprestam aquele ar de totó social-democrata bem à moda de Braga de Macedo. Terá feito as contas à (in)cultura laranja e ao que esta dá aos poucos cultos que a servem? Lá chegaremos.

Primeiro bateu à porta do PS de Guterres, naquele discurso mole e coração amanteigado, a sua férrea persistência vingaria ao primeiro golpe, mas a paixão de Tonecas era outra, e como todos sabemos, na fila para esse peditório o PS já tinha verdadeiros intelectuais (e artistas…) que chegue. O seu coração socialista, assim bateu entre 97 e 2000, foi traído e logo se liberalizou. Bateu à porta dos vários PSD´s, onde qualquer pseudo qualquer coisa era imediatamente bem vindo.

Em 2001, ainda não tinham metido o Pacheco Pereira no bolso, o Santana Lopes já tinha a sua Marina Mota, e ele escolheu ser (ou foi escolhido para...) consigliere cultural na família oeirense do  D.Isaltino. Mas às primeiras ameaças de que o Estado de Direito também vigorava pela Linha logo B(f)úgio. Tem méritos e qualidades pessoais, caso contrário jamais sería Secretário de Estado da Cultura (vide Miguel Relvas...), mesmo que o seja sob coordenação do mais inculto dos Primeiro-Ministros. É determinado, inteligente, perspicaz, pragmático e servil, qualidades inatas para um Secretário de Estado sem programa de governo ou orçamento para o aplicar. Talvez por isto mesmo não hesite em vender anéis com os dedos se necessário for. Para não voltar para Goa, mesmo que na mala diplomática, vale tudo, afinal de contas a maior parte da colecção Miró não vale uma chamuça.

Agora "back to basics", aquele tipo sagaz que viu a oportunidade, criou a sua própria organização (CPAI) onde era presidente, tesoureiro, secretária e faxineira, para ter um palco só para si, não é ele mesmo a personificação do "empreendedorismo social" do "bater punho" à Relvas?! Recorrer à manobra e à mais estranha das alianças para pertencer onde não tinha lugar (CNJ-Conselho Nacional de Juventude) por troca com a "facilitação" do voto não é da práctica parlamentar mais moderna e ainda recentemente "referandada" pelas bancadas que suportam a maioria?! Vivêssemos nós ainda no 24 de Abril e o jovem empreendedor cultural seria perfeito estandarte da imperial Mocidade Portuguesa, tivesse retornado para um Portugal comunista e ostentaria com orgulho o crachá de "pioneiro" exemplar.

A ambição acrítica, mata o espírito e transforma paulatinamente o jovem empreendedor num ente acrítico como se quer que ele o seja. Hoje na sua aquiescência cega é o antídoto perfeito para a virulência da inovação, para rebeldia da criatividade, para a cultura da memória…  

Festejará em breve o dia da libertação da troika e da alienação do património cultural e quando a festa acabar irá trabalhar para quem melhor lhe pagar. Como ex-Secretário de Estado da Cultura dificilmente será convidado para presidir à Lusoponte ou ao Banif, mas como leiloeiro da Christie's não conhecerá as dificuldades que ajudou a infligir ao comum dos portugueses.

Os nossos filhos ouvirão um dia no recreio da escola:

"- Olha ali um Miró, totó!" 

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publicado às 12:07

Greve à diáspora*

por Nuno Félix, em 29.01.14

Ouvido na TSF

- "Em que medida é que esta greve [dos controladores aéreos] a prejudica?" 

- "A greve não me causa transtorno, causa-me transtorno ter de emigrar", respondeu a jovem. "Vou aproveitar as duas horas de atraso para estar com a família".

 

*O termo diáspora define o deslocamento, normalmente forçado ou incentivado, de grandes massas populacionais originárias de uma zona determinada para várias áreas de acolhimento distintas. O termo "diáspora" é usado com muita freqüência para fazer referência à dispersão do povo judeu no mundo antigo, a partir do exílio na Babilônia no século VI a.C. e, especialmente, depois da destruição de Jerusalém em 135 d.C.

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publicado às 19:11

O Panteão não é só para o escrivão e para o charlatão.

por Nuno Félix, em 08.01.14

Nem o Eusébio foi apenas um atleta de exceção nem o futebol é apenas mais uma modalidade desportiva. Eusébio pode reclamar para si uma boa parte do orgulho, sentimento de pertença, dignidade nacional que assistiu a um país "orgulhosamente só" pluri-continental, ultra-analfabeto, mega-pobre, multi-miserável. Para mais de uma geração, e muito em particular para os portugueses na diáspora, Eusébio foi, a dada altura, talvez a melhor razão para continuarmos a ser portugueses, ou pelo menos para continuarmos a sê-lo com menos vergonha. Aliás, até Salazar percebeu que tinha ali um "património nacional" essencial para a própria coesão do Império e para a sua sobrevivência no contexto internacional. E quanto ao ofício... bem, deve o Panteão ser reservado apenas a alfabetizados escritores e trovadores? Que não haja quaisquer dúvidas em afirmar que se antigamente os povos vibravam com feitos dos nossos maiores guerreiros, relatados uma pena inspirada ou por uma voz mais afinada, e apenas assim conquistaram a eternidade, hoje, na era do digital/global essa poesia escreve-se de 15 em 15 dias no Bernabéu em direto e a cores para centenas de milhões de pessoas. Aliás à nossa escala, não fosse o futebol e é fiável apostar que 99% dos portugueses nascidos depois do 25 de Abril desconheceriam por completo o próprio hino nacional.

Eusébio no Panteão claro está porque estamos no século XXI, com tudo o que isso significa de bom e de menos promissor.

Hoje os lobos uivam quando, e à escala planetária, de cabeça, de pé direito ou com a canhota, o Aquilino Ribeiro que joga com a camisola 7 da nossa seleção, marca um golo para alegria de todo um povo, amaldiçoado pela diáspora, condenado pelas suas elites. As mesmas que reservam para si o direito de ocupar os jasigos vagos no Panteão Nacional.

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publicado às 21:56

"Grande-Oficial" e o Cangalheiro.

por Nuno Félix, em 03.01.14

“É indescritível o sentimento de orgulho e honra por esta distinção e por este reconhecimento por parte do mais alto representante do Estado português”, comentou humildemente Cristiano Ronaldo.

A Ordem do Infante D. Henrique distingue quem “houver prestado serviços relevantes a Portugal, no país e no estrangeiro, assim como serviços na expansão da cultura portuguesa ou para conhecimento de Portugal, da sua História e dos seus valores”, o que se “aplica a Cristiano Ronaldo, que ao longo dos anos tem elevado o nome do país”.

Já em 2004, depois do Europeu de Futebol que se realizou em Portugal, Cristiano Ronaldo, juntamente com toda a equipa da seleção nacional, recebera das mãos do então Presidente da República, Jorge Sampaio, o grau de Oficial desta mesma Ordem. Dez anos depois, o jogador do Real Madrid receberá de Cavaco Silva o ... grau de Grande-Oficial da Ordem do Infante D. Henrique.

 

Ronaldo é então agora promovido de mero "Oficial" a "Grande-oficial" da Ordem do Infante D. Henrique 10 anos depois…segundo a página oficial do Palácio de Belém por ser um “atleta de renome internacional que tem sido um símbolo de Portugal em todo o Mundo, assim contribuindo para a projeção internacional do país, e um exemplo de tenacidade para as novas gerações”.

 

Ora vamos aos factos, nestes 10 anos o cidadão Cristiano Ronaldo dos Santos Aveiro tornou-se, porventura, no único português da nossa história quase milenar conhecido e reconhecido em vida pelo seu mérito à escala planetária. Aos 28 anos, o madeirense fez inquestionavelmente mais pelo país de Cristiano Ronaldo, do que grande parte dos Senhores Comendadores que se passeiam de medalhão ao peito no 10 de junho.

Para mais do mesmo, o Presidente da República do país de Cristiano Ronaldo só pode andar muito distraído, ou talvez não tenha saído muito do Palácio, e menos ainda além fronteiras... É que quem tem um pedacinho de Mundo, pode comprovar facilmente de Este a Oeste, do Pólo Norte (onde fui reconhecido como seu compatriota) aos recentemente resgatados exploradores da Antártida, toda a gente sabe responder à pergunta: - "Quem é Cristiano Ronaldo?" Da mesma forma, infelizmente, muito poucos sabem ao certo onde fica o país do qual é nacional "O melhor jogador do Mundo".

Fosse outro o ramo de atividade do cidadão Cristiano Aveiro, e a nação já o teria agraciado há muito com a Grã-Cruz, senão mesmo com Grande Colar da mesma Ordem, onde ficaria na solidão da indesejável companhia de um pouco viajado e recomendável cidadão - o felizmente já falecido professor de Finanças António de Oliveira Salazar.

Para que se saiba, o capitão da nossa Seleção Nacional de Futebol, na opinião da Presidência do país de CR7, ainda não fez o suficiente "ao serviço da expansão da cultura portuguesa ou para conhecimento de Portugal, da sua História e dos seus valores" que merecesse a mesma honra dos excelsos "embaixadores" que receberam a Grã-Cruz só no último ano! Foram eles:

- António Lobo Antunes (ex-secretário de Estado, diplomata de carreira e bom nome de família);

- João Proença (reformado de sindicalista como deputado...); 

- José Hermano Saraiva (ex-ministro de Salazar e inventor histórico de prosa escorreita);

- Joaquim Germano Pinto Machado Correia da Silva (ex-deputado à Assembleia Nacional e membro da Comissão de Apoio a Cavaco Silva na campanha às eleições presidenciais);

- Ruy Alberto Rebelo Pires de Carvalho (Presidente do Conselho Nacional para a Política da 3.ª Idade e mandatário da campanha de candidatura de Pedro Santana Lopes à CML e da campanha de candidatura de Carmona Rodrigues à... CML);

- Pedro Manuel Guedes de Passos Canavarro (coveiro do PRD, trineto do político e parlamentar Passos Manuel e vive em Santarém numa casa outrora habitada por D. Afonso Henriques);

- Diogo Alves de Sousa de Vasconcelos (ilustre militante do PSD e mandatário digital da candidatura de Cavaco Silva às eleições presidenciais);

Manuel Ferreira Patrício (nem entrada tem na Wiki mas sabemos que fez parte do Conselho Coordenador do Ensino Superior Particular e Cooperativo...)
- Lúcio Alberto de Assunção Barbosa (delegado do procurador da República nas comarcas do Bié, Angola, e Santo Tirso,  J
uiz de Direito nas comarcas de Cinfães e Resende, Tribunal de Polícia do Porto, Tribunal Tributário de 1.ª Instância do Porto e Tribunal Fiscal Aduaneiro do Porto, foi ainda juiz desembargador do Tribunal Tributário de 2.ª instância até chegar ao STJ);

- Domingos Teixeira de Abreu Fezas Vital (ex-assessor diplomático do Governador de Macau, general Vasco Rocha Vieira, que apoiou a candidatura de Cavaco Silva à Presidência é hoje assessor diplomático de... Cavaco Silva).

 

P.s.: Cristiano se queres honras da República pede ao Florentino Pérez para te transferir para o Clube Desportivo de Boliqueime. A modalidade mais forte é o hóquei em patins, mas na República de Cavaco tens mais hipóteses de receberes a Grã-Cruz como campeão destrital de Faro dos 110 metros barreiras, do que como o Bola de Ouro, Bota de Ouro, ou medalha de ouro como campeão mundial de futebol.

 

 

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publicado às 18:22

Benilde, a criada.

por Nuno Félix, em 28.12.13

 Para quem um exercício crítico sobre a caridade raia a eresia, e a solidariedade não passa da "caridade da esquerda", para quem "os tribunais do trabalho são contra os empregadores", para quem o salário mínimo é uma limitação à liberdade de contratar, e a ter que existir, o seu valor é sempre um obstáculo à própria contratação e uma boa desculpa para os números do desemprego ou até para a anemia da iniciativa. Para quem é filho, pai, marido, amigo, de uma Ernestina qualquer e isso o compraz. Que saiba aqui que ser de esquerda é combater estas e outras injustiças, é combatê-los a eles, os exploradores, os que abusam da sua posição (social, económica, até intelectual) para subjugar outros seus iguais mas em quem eles mais não vêm que o seu "conteúdo funcional".

 

"Analfabeta, nunca casou e cuidou da patroa até ela morrer. Agora pede aos herdeiros que paguem tudo aquilo a que tinha direito e nunca recebeu

Benilde não o sabia, mas aos 17 anos entregou a sua vida a Ernestina. Quando deu por ela tinham passado cinco décadas, a patroa estava deitada na cama às portas da morte, ela noutra cama no mesmo quarto a acorrer aos seus ais, e sem ter ninguém. Benilde não se casou, não teve filhos. Nem tão-pouco se lhe conheceram namorados, saídas nocturnas ou matinés com as amigas. Durante 50 anos foi uma criada exemplar: limpava a casa, lavava e engomava a roupa, engraxava os sapatos, preparava e cozinhava as refeições, tratava do galinheiro, da horta e do jardim e, se preciso fosse, ainda acordava a meio da noite para cuidar da patroa. Não folgava, não gozava feriados - a não ser o dia de Natal - e mesmo quando ia à missa obrigava-se a regressar a correr porque o trabalho não esperava. No meio disto, nunca aprendeu a ler nem a escrever. Benilde, analfabeta, passou dois quartos de século a trabalhar, sete dias por semana. Em troca, nunca ganhou mais de 150 euros por mês." In Jornal I 27\12\12

 

Esta história começou em 1960, mas chegou aos nossos dias contemporânea do trabalho escravo que persiste em florescer num país em que um teto e pão cada vez mais preenchem a ambição de muitos portugueses. O texto da notícia choca pelo voluntarismo ingénuo de Benilde e pela crueza do distanciamento da patroa Ernestina com quem privou, num dado sentido, mais do que muitas pessoas em união de fato ou até em matrimónio. Feitas as contas, uma mulher passou ao lado da vida servindo a vida de outra para que esta a passasse melhor poupando-a a sequer um só dia solidão até ao fim duns bem cuidados 99 anos.

Por fim, na morte como na vida, a gratidão dos Senhores sobre os serviçais, uma espécie de mão-invísivel, de tal forma invísivel, que das poucas vezes que foi avistada pariu santos e mecenas, e que no caso concreto não mostrou mais do que a falangeta do mindinho. Ingrata pelos 50 anos de doce e fiel proto-escravatura a "criada" pediu aos herdeiros testamentados a possível reparação.

Último recurso dos fracos contra os fortes, a lei, que protege os primeiros e que os segundos dispensam, no "Tribunal de primeira instância condenou os herdeiros a pagar a Benilde 18 659 euros, fora juros de mora, devido ao salário não actualizado e aos subsídios que ficaram por pagar. Mas Benilde recorreu, inconformada por aquele tribunal ter concluído que "trabalhava sete dias por semana, folgando por vezes ao domingo", e invocando que a ser descontado do salário mínimo mensal valores de alimentação e alojamento - que não pagava - esse valor nunca poderia ser superior a 47% do ordenado mínimo.

Chamado a decidir, o Tribunal da Relação do Porto concluiu que Benilde gostava da patroa como de uma mãe e se mais vezes não folgou ao domingo foi porque não quis. "Seguramente algumas vezes não foi preciso fazer o almoço de domingo, nem voltar para fazer o jantar, e algumas vezes a recorrente gozou a sua folga, fora de casa, ainda que sempre voltasse para dormir, e que a gozou sem sair da casa, que era também a sua", diz o acórdão, que não foi em tudo desfavorável a Benilde.

Concordando que alimentação e alojamento não podem representar mais de 47% do ordenado, os juízes desembargadores mandaram calcular quanto custaria um quarto naquela região e alimentação completa, ano após ano, desde 1992. O juiz vai ter de voltar a ouvir a história de Benilde."

E que país míseravel é este em que uma farda, um quarto refundido, e as sobras da refeição da patroa pode contabililizar mais do que 47% da remuneração devida?!

 

O que diz o acórdão do Tribunal da Relação do Porto

“Pelo menos desde 1960, por acordo efectuado verbalmente, a B. trabalhava para E. como empregada doméstica. As funções de B. consistiam em confeccionar refeições, fazer a lavagem e tratamento de roupas, serviços de jardinagem, cultivo da horta e execução de outras tarefas relacionadas com estas. Nos últimos anos, a sua função era de vigilância e assistência a E., mantendo as funções relacionadas com a casa de habitação. A B. vivia em casa de E., que lhe fornecia alimentação e alojamento. A B. nunca gozou férias enquanto trabalhou para a E. A B. trabalhava sete dias por semana, folgando por vezes ao Domingo. A B. vivia em casa da E., estando sempre disponível para as necessidades desta, tratando-a como se fosse sua mãe. A B. nunca gozou qualquer feriado obrigatório com excepção do dia 25/12. A B. nunca auferiu subsídio de natal ou subsídio de férias. Durante os vários anos que trabalhou para a referida E., nunca a B. reclamou quanto ao salário pago, horas de trabalho, falta de gozo de dias de descanso ou falta de pagamento do que quer que fosse.”

“E. era uma pessoa doutros tempos, antiga, cuja perspectiva sobre a relevância da criada era a da sua redução a uma trabalhadora permanente, sem qualquer interesse próprio. [...] É um facto notório e absolutamente incontestável que esta foi a perspectiva de muitas pessoas antigas, obviamente não de todas e variando de meio rural para urbano e de meio urbano para meio urbano concretamente considerado. E é também absolutamente comum que muitas destas empregadas se afeiçoaram – à míngua da possibilidade de tempo e dinheiro para desenvolverem outros interesses – aos seus patrões, aos quais dedicaram toda a vida, e em cujas famílias praticamente se integraram.”

“Reafirmamos que para uma empregada doméstica alojada, o facto de estar em casa não significa estar a trabalhar, podendo estar também a descansar, seja no seu próprio quarto ou alojamento, seja no resto da casa, ou no quintal, e o tempo de receber visitas próprias nessa casa, sem estar a trabalhar, é tempo de descanso.”

“E conjugando os depoimentos, de F., G. e H., temos de aceitar que a recorrente ia algumas vezes visitar a família, e apreciados os mesmos à luz das regras de experiência normal, temos de considerar que os depoimentos se referem a uma realidade genérica, mas não concretizam domingo a domingo de 50 anos, o que seria absolutamente impossível. E temos de considerar que seguramente algumas vezes não foi preciso fazer o almoço de domingo, nem voltar para fazer o jantar, e algumas vezes a recorrente gozou a sua folga, fora de casa, ainda que sempre voltasse para dormir, e que a gozou sem sair da casa, que era também a sua.”

“Ora, no âmbito do seu contrato, a B. tinha alojamento e alimentação e por isso o custo respectivo não teve de ser por ela especificamente pago em contado. A Autora beneficiou desse alojamento e alimentação. É verdade que no caso em que o trabalhador tem um alojamento próprio, o alojamento em regime de internato no domicílio patronal se afigura mais benéfico ao empregador do que ao trabalhador. [...] Em suma, não é defensável que o alojamento não possa ser considerado retribuição por ser estabelecido em favor do empregador.”

“Sendo a disciplina regulada de modo idêntico ao longo dos diversos diplomas, neste ponto concreto do recurso assiste inteira razão à recorrente. Na matéria de facto provada apenas se apurou alojamento e alimentação – de resto, sem mais qualquer pormenorização – e não se apurou – o que também era discutido – se a recorrente igualmente beneficiava de vestuário fornecido pela empregadora. Não se tendo apurado qualquer outra prestação em espécie além do alojamento e alimentação, o valor percentual (35% para a alimentação e 12% para o alojamento) montava a 47%, percentagem que era o máximo que podia ter sido considerado. Haverá assim que, relativamente a todos os cálculos aplicar um aumento de 3%.”

“Nestes termos, e nos do artigo 662.o n.o 2 al. c) parte final do CPC (na versão da Lei 41/2013 de 26.6) anula-se oficiosamente a decisão da matéria de facto, ordenando-se a ampliação da matéria de facto para se apurar se o alojamento da recorrente era um quarto na casa da empregadora e para apurar o valor corrente na região dum quarto e da alimentação completa, ano a ano, em todos os anos reclamados pela recorrente, desde 1992, se necessário com um convite às partes para alegarem factos pertinentes.”

 

Esta é apenas uma história triste, mais uma da nossa triste história, que escolhi para meu primeiro texto aqui no Filibuster, para ilustrar e justificar as 3 razões que me levaram a aceitar escrever aqui. Ser de esquerda, ser português, ser humano.

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publicado às 18:50





Filibuster, subs.

1. Utilização de tácticas de obstrução, tais como o uso prolongado da palavra, por membros de uma assembleia legislativa de forma a impedir a adopção de medidas ou a forçar uma decisão, através de meios que não violam tecnicamente os procedimentos devidos;

Filibuster, noun
1. The use of obstructive tactics, such as prolonged speaking, by a member of a legislative assembly to prevent the adoption of measure or to force a decision, in a way that does not technically contravene the required procedures;

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